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Análise : Art. 30 x Art. 2º da Lei Complementar 187/2021 (CEBAS)

E a importância dos negócios sociais na sustentabilidade das OSCs


A Lei Complementar 187/2021 promoveu uma das atualizações mais relevantes do regime jurídico das entidades beneficentes no Brasil. Entre os dispositivos centrais para a interpretação do alcance e dos limites da atuação econômica dessas organizações, destacam-se o artigo 2º — que define o conceito de entidade beneficente — e o artigo 30, que disciplina a possibilidade de receitas provenientes de atividades não gratuitas.


1. A leitura conjunta dos dispositivos: amplitude, finalidade e sustentabilidade


Art. 2º — Essência da entidade beneficente


O art. 2º define que uma entidade beneficente é aquela sem fins lucrativos, que aplica integralmente seus recursos na manutenção e no desenvolvimento dos objetivos institucionais, atuando nas áreas de educação, saúde ou assistência social.


Esse dispositivo reafirma que a finalidade é institucional, não mercantil, mas não impede que a entidade desenvolva atividades econômicas. A restrição é ao destino do resultado, e não à geração dele.


Art. 30 — Atividades econômicas e cobrança por serviços


O art. 30 rompe uma visão ultrapassada que associava gratuidade absoluta à natureza beneficente. Ele autoriza expressamente a entidade a:


  • Cobrar pelos serviços prestados, desde que mantenha o percentual mínimo de gratuidade exigido pela lei;

  • Desenvolver atividades acessórias ou complementares, inclusive de natureza econômica, com receitas destinadas exclusivamente à finalidade institucional.


Assim, a LC 187/2021 moderniza o regime do CEBAS ao reconhecer que sustentabilidade econômica é parte da sustentabilidade social.


Assim, a LC 187/2021 moderniza o regime do CEBAS ao reconhecer que sustentabilidade econômica é parte da sustentabilidade social.



2. A lógica contemporânea do terceiro setor: missão com geração de receita


A leitura sistêmica dos dois artigos revela um ponto essencial:


Negócios sociais e atividades econômicas não ameaçam a certificação — pelo contrário, podem fortalecê-la, desde que o resultado seja integralmente reinvestido na missão.


O Estado reconhece que depender exclusivamente de recursos públicos, doações e editais não é compatível com a realidade das OSCs no século XXI.A LC 187/2021 corrige essa lacuna ao abrir espaço para modelos híbridos: organizações com finalidade pública, mas com mecanismos próprios de sustentação.



3. Importância dos negócios sociais (social business) para OSCs com CEBAS


a) Sustentabilidade financeira e estabilidade institucional


A legislação permite que OSCs criem negócios sociais para evitar interrupções ou oscilações de atendimento. Essa previsibilidade é essencial para entidades que oferecem serviços continuados, como educação complementar, ações socioassistenciais, programas de cultura, entre outros.


b) Redução da dependência de repasses públicos


Como o art. 30 autoriza geração de receitas próprias, a OSC passa a ter autonomia. Isso reduz a vulnerabilidade a mudanças políticas, atrasos de repasses ou cortes orçamentários — todos comuns na relação com o poder público.


c) Inovação social e profissionalização


Negócios sociais estimulam:


  • Planejamento estratégico,

  • Governança,

  • Gestão financeira,

  • Métricas de impacto.


Tudo isso é compatível e desejável dentro do regime do CEBAS, que exige transparência e eficiência.


d) Manutenção da gratuidade legal


O ponto crucial é que a OSC continue a cumprir os percentuais mínimos de gratuidade previstos no CEBAS.


A receita gerada pelas atividades econômicas auxilia justamente na manutenção desses percentuais, reforçando o atendimento gratuito à população em vulnerabilidade.


e) Alinhamento com o espírito da lei


A LC 187/2021 não busca punir OSCs que inovam, empreendem ou criam soluções sustentáveis. Ao contrário, ela:


  • Incentiva a diversidade de fontes de receita;

  • Protege o caráter institucional;

  • Permite que o resultado financeiro seja um meio, e não um fim.



4. Conclusão


A interpretação combinada do art. 2º e do art. 30 deixa claro que:


O modelo de entidade beneficente no Brasil não exclui, nem desestimula, a existência de negócios sociais. Ele apenas exige que toda atividade econômica seja um instrumento de fortalecimento da missão social.


Essa leitura moderna, alinhada às melhores práticas internacionais, reconhece que:


  • Instituições sólidas precisam de receitas diversificadas;

  • Sustentabilidade financeira é condição para sustentabilidade social;

  • Negócios sociais são ferramentas legítimas, legais e estratégicas dentro do regime do CEBAS.


Portanto, uma OSC que desenvolve negócios sociais — como lojas, confecções, cursos pagos, serviços remunerados ou qualquer atividade econômica lícita — não corre risco de perder a certificação, desde que cumpra as regras do art. 30 e mantenha sua finalidade pública prevista no art. 2º.


O CEBAS evoluiu.

Logo, as OSCs também precisam evoluir — e os negócios sociais são uma parte indispensável desse caminho.



Sérgio Martins

Músico, Advogado CEO da Casa Cultural Dona Antônia.




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